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domingo, 13 de março de 2022

Conto 'Projeto Antícronos'

Naquele mundo haviam numerosas bestas-feras pré-históricas, seres de grande porte arrastando árvores nas florestas tropicais e devorando criaturas modernas. O peculiar era que dentre as florestas atípicas para tais seres extintos, ruínas de edificações humanas por onde a vegetação selvagem tomava e os poucos seres humanoides sobreviventes agora agiam como bestas-humanas. Como se duas épocas distintas agora tivessem se sobreposto anulando-se.


10 anos antes, Rio de Janeiro, 2046.

Aquele experimento deu muito errado. Abriu as portas da história apenas para a pré-história, e se antes a viagem no tempo buscava descortinar nas brumas do desconhecido atos e fatos não revelados agora trouxemos o passado ao presente para extinguir o futuro. Ao invés de retornar para o passado a investigar, o passado nos sobreveio de sobressalto, invadindo o mundo com dinossauros. O caos instalado na sociedade não apenas instalou a crise, mas arruinou biomas e ecossistemas. A internet ruiu e o medo se instalou ante o ódio que se generalizou por um vírus primordial desconhecido, que existia apenas há milhões de anos. Este mutou e aos humanos infectou, afetando diretamente as sinapses neurológicas, destituindo a objetividade e lucidez humana ao nível de seres irracionais que aniquilavam tudo que lhe era diferente, ou discordante. Gerando inicial paranoia o vírus em sua progressão toda lei ignora, e atrofiando memórias levava estes gradualmente se tornarem animais extremamente violentos e hiperssexualizados.

Mas sabíamos haver um traidor no Projeto Antícronos e conquistar de volta minha confiança outrora quebrada seria tão fácil quanto reverter a entropia.

– Nosso suspeito é um agente temponauta que desapareceu na incursão passada. Ele alegou encontrar outros viajantes do tempo mais poderosos. A perda de contato e o desaparecimento de dados torna-o suspeito e por isso foragido. – Comentei.

– A falha consistente no reator de geração de antigravidade por realimentação dimensional indica ter sido uma sabotagem, mas a única testemunha fora infectada pelo vírus ao tornar o tecido do espaço-tempo um queijo suíço.

Fomos até ela interrogar, mas entorpecida pelo ódio estava amarrada, espumando a boca pelo sofrimento e morte dos que lhe cercavam. Sem menor sentido. Haviam poucos e raros momentos de lucidez capazes de extrair palavras que não fossem de ódio e medo, tornando o paciente zero apenas útil as pesquisas do desenvolvimento da chamada de doença retroprimal ainda que sem conseguir ainda isolar o suposto vírus. Era domada por volições incontroláveis, sendo quase impossível estabelecer qualquer diálogo civilizatório mínimo.

– Apenas nos diga quem provocou a reação em cadeia no vórtice! Precisamos de seu auxílio para te curar e, ao mundo!

Mas antes de modo rude ela se virou com ódio e escarrando disse coisas grosseiras de cunho de violência sexual. O vírus alegado teria se espalhado destituindo as regiões cerebrais capazes do raciocínio lógico rebaixado a consciência a uma besta incontrolável as leis e convívio social. Pesquisamos por horas a fio enquanto víamos enormes dinossauros invadindo florestas e cidades enquanto os cidadãos matavam uns aos outros, o projeto que era seguro como uma moderna usina nuclear apenas poderia falhar ante a intencional e sistemática sabotagem.

Totalmente exausto sentei-me no meu leito diante de monitores holográficos de câmeras exteriores a desvelar um tiranossauro rex as portas de nosso laboratório. A besta era impedida de adentrar graças ameaças de rivalidades entre um alossauro que pareciam disputar francamente de quem nós seríamos as presas, enquanto pelas beiradas veloceraptores rondavam buscando brechas, comendo pelas pontas em bandos após matarem um anquilossauro.

– Há uma estimativa que apenas nessa região uns 2000 dinossauros de diversas espécies atravessaram. O que é estranho, uma vez que não são apenas do jurássico, mas período triácico. Parece que algo atraiu literalmente vidas para convergir nesse ponto do espaço-tempo, e os poucos que não foram ainda infectados os enfrentam.

– Vocês tem estimativas estatísticas de vítimas e bestas abatidas... infectados? – Indaguei.

– Não, dr.Machado. Tudo está ruindo rápido, mesmo aeronaves são atacadas por pterodátilos quando em voos infectados derrubam os aviões em ataques sexuais, ou de mero ódio.

Abaixei a cabeça e pus as mãos sobre o rosto em desgosto, tudo que havia de mais cruel e desumano havia tomado o mundo de assalto. A guerra não tem lados, pois todos nela estão ao lado da violência e morte! Restávamos apenas nos defender e resistir.

Fora assim que então dormi e no estupor da exaustão anseios e medos me tomaram levando-o a ter um pesadelo.

Em tal estado de horror via a pré-história a tudo sobrepor como fim da história, num pós-história onde apenas o agora importava a sobrevivência. Nela um memorial ao anônimo era um rememorar do esquecimento, como ao lado de um grande homem de palha erguido como um espantalho ao conhecimento.

Naquele pesadelo o homem de palha tomava vida, e munido de seu arsenal falacioso de sofismas partiu diretamente ao ab hominem como retórica da mentira sobre a verdade. Todos lindos pássaros fugiram ao rugir do espantalho, sobre as flores pisotearam e de modo iniquo nos condenavam.

Saltei da cama ruborizado vindo tomar a água do reservatório que duraria apenas alguns poucos dias, assim como provisões não perecíveis que não alimentaria a todos por mais de um mês. Todavia, fui surpreendido com o bater de portas com o assistente afirmando ter tido contato com os três últimos governos ainda de pé no mundo, o Japão, Israel e Espanha, resumindo os demais lugares com grupos sobreviventes isolados a própria sorte, sem menor ordem governamental.

– Parece que os japoneses isolaram e decodificaram o genoma do vírus em tempo recorde. É equidistante de todos os atualmente conhecidos, mas algumas estruturas possuem semelhança de ancestralidade com a raiva, mesmo que muito mais aguda e virulenta. Perceberam, sobretudo que atacam o circulatório necrosando gradualmente extremidades do corpo e assim afetando o sistema nervoso gerando perda do tecido neurológico associado a autoconsciência.

– Quanto tempo leva até o óbito? – Indaguei eu.

– Pouco mais de um mês, varia de cada infectado. Porém, tem algo incomum, dr.Machado. Parece que encontraram raros exemplares de pessoas que criam imunidade com um efeito colateral incógnito.

– Qual?

– Algumas partes neurológicas afetadas tem suas funções alteradas aumentando a sensibilidade aparentemente além sensorial, dos cinco sentidos.

– Vidência?

– Não há testes e experiências conclusivas, mas ao que sugerem alguns geram habilidades preditivas além material e mesmo conexões empáticas a distância. Os resultados preliminares sugerem ser capazes de encontrar caminhos no caos e forte repulsão sensível ao ódio e medo. Como uma forma de resistência neurológica a seu oposto.

Fiquei perplexo com as implicações daquele Fator X, ao saber que seres dotados além sensorial sentiam as sensações volitivas que desencadeavam a violência ou morte em sua intencionalidade. E conseguiam assim detectar mesmo infectados em estados iniciais, tanto pessoalmente como remotamente. Meu silêncio contemplativo fora interrompido quando o assistente completou.

– Um deles chegou essa manhã aqui, com as técnicas de detecção e para rastrear. E para nossa surpresa a nossa meliante infectada com amarras na maca, não estava infectada, fugiu com ajuda de outra pessoa!

De fato não apresentava parte dos sintomas. E meu assistente, um negro de dois metros que poderia bem ter seguido a carreira no basquete optou pelas ciências, mas parecia pálido de medo, ainda que a despeito de seu tamanho, como um gigante cordial.

– Acionaram os alarmes e fecharam todas as saídas? Procure em todas as câmeras e isole todos em seus aposentos enviando apenas os seguranças até acha-los!

– As câmeras do local foram desligadas antes. O sujeito sabia muito bem o que fazia o tempo todo, suas atitudes dissimuladas de ódio eram totalmente conscientes. Todavia, encontramos algo no registro de operações do gerador de campo temporal antes do incidente. Ele deliberadamente desestabilizou o campo antigravitacional gerando maior energia que suportaria a alimentação do vórtice, gerando efeitos em cascata em vários pontos do planeta.

– E nosso temponauta, sinal dele?

– Rastreamos sinais de alterações de assinaturas na entropia de uma outra época, pelo século XXV. Aparenta terem sido viajantes de outra dimensão que tentaram conter o incidente. Mas o seu traidor tenta na verdade roubar sua tecnologia para outros contactados, nós sabotando aqui.

– Alguns querem usar minhas ideias e me culpar por seus crimes! O que podemos fazer?

– Nossa tecnologia ainda tem alcance muito limitado mas recebemos sinais de tentativa de contato de um grupo chamado T.E.M.P.U.S., o conhecimento deles de tais rupturas de destino é muito maior que o nosso.

– Ampliem os esforços e capturem esses dois traidores mercenários! Eles não vão fazer fortuna arruinando esse mundo e me culpando! No capitalismo de alguns temos que pagar o que nos devem! E obedecer para o crime sofrer! Só que nunca!

Os dois prosseguiram ao alcance dos traidores até que com auxílio do sensitivo detectou sua posição entre os dutos de ventilação. Capturados, fora interrogados negando dar informações, mas o sensitivo penetrou suas mentes sabendo seus propósitos. Uma elite moral e intelectualmente derrotada que sabendo não ter mais o amor dos povos agora ansiava impor terem corpos contra o direito, por nunca terem mentes e corações livremente!

A mulher, uma ruiva, escarrou no meu rosto sabendo o ódio ser comum aos gananciosos corruptos que por incapacidade de superar restava apenas tentar nos destruir.

– Para quem vocês venderam nossa tecnologia? Diga! – Vociferei sabendo eles serem responsáveis pelo genocídio de milhões. 

Assim ela respondeu.

– A crononazistas que passaram gerações coletando tecnologias e ciências de civilizações avançadas paralelas ou do futuro. Apenas os do antigo domínio temporal de Fu-Xi os impede de terem o maior compêndio científico do multiverso! Eles agora estão caçando os crononazistas que os viajantes da TEMPUS não detiveram pelo multiverso, pois levaram ao fim do mundo destes temponautas como e a centenas de distopias variáveis.

Como aquilo era possível? Segundo o traidor um artefato passado por um misterioso homem sem pelos no corpo produziu uma tecnologia capaz de nazistas fugirem pelo tempo ao fim da Grande Guerra. Die Glocke, “O sino” do qual um aliado dele aparentemente imortal havia sido capturado e estudado há anos. Semelhante a eles tememos ser algum tipo de aberração biológica, pois o homem aparentava ser imortal mesmo que libertado posteriormente pelas elites que treinaram aqueles traidores.

Aquele mundo desmoronou voltando ser um grande mundo pré-histórico perdido para a civilização, levando-nos a sermos resgatados pelos temponautas que estudou e pesquisou por vários meses o resultado em nosso mundo apocalíptico, como o que alegariam acontecer com o deles.


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