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sexta-feira, 27 de maio de 2016

Trecho do conto 'A Dimensão dos Sonhos'

Abaixo publico um trecho do conto 'A Dimensão dos Sonhos' que conclui a série de livros 'Adormecidos' (Sleepners) publicado originalmente pela Ryoki Produções. O Conto de Gerson Avillez faz parte da antologia 'Todas Formas de Sonhar'.

A maior parte da humanidade sonha, quem não sonha tem problemas. Dentre todos esses sonhos as crianças nunca aparecem no próprio sonho antes dos 3 ou 4 anos de idade enquanto uma pessoa de meia idade sonho aproximadamente 2100 dias, ou seis anos. Sonhos estes que na maioria dos casos são esquecidos 10 minutos após o mesmo. Os sonhos são a porta para um mundo ainda não plenamente conhecido pela ciência...

    A humanidade a beira do abismo e acossada venceu uma batalha para quase desfigurar-se de si própria permanecendo incólume nos anos seguintes. Após uma espécie alienígena que se alimentava dos sonhos humanos atacar restou ante o quase hecatombe adequar sua tecnologia como fuga de um planeta desolado.
    No meio do turbilhão que sobreveio ao que restou da humanidade, uma testemunha viva do primeiro contato, Hedi Ofir, que peculiarmente se tornou cobaia e vítima de ambos lados da guerra. Anos após se tornou o primeiro dentre muitos a refutar a prática da tecnologia onírica ao ser sancionada por legislações que limitassem seu uso, tornando preciso uma repartição para estudar crimes oníricos.
    Mas em meio a trama que seguia, Ofir viu-se envolto numa conspiração que pareciam exceder os limites temporais presentes ao além agora. Pego pelo mesmo artefato que contatou na adolescência ele fora submergido num sono insólito através dos tempos.
    Seu corpo inerte permaneceu num estado letárgico por longos dias. O que parecia um sono profundo, todavia, fora diagnosticado como uma espécie de coma, similarmente a uma mulher chamada Sofia que nisso estava há anos. O jovem policial moreno e de cabelo liso responsável por investigar crimes oníricos para ser vítima de um. Assim passaram-se longos dias até que ele, quando menos se esperava despertou rufando em desespero como quem  acorda de um pesadelo.
    - Tudo se repetiu! A invasão e todo apocalipse! – Gritou ele da cama assustado se referindo ao apocalipse global que sofreram. – Não consegui salvar Corine! Vocês gravaram todo sonho?
    - Monitoramos maior parte. Não houve memória para tudo. – Explicou o médico onírico, conhecido por oniricologista. - Você estava num estado onírico diferente, era como se fosse um estado REM prolongado de dias, somente com Sofia aconteceu algo assim, mas se quer sabemos de onde ela veio mas com o conhecimento que nos trouxe assim a batizamos. Tentamos adentrar seu sonho mas por algum motivo não conseguimos.
    - Onde estou? – Indagou ele perplexo e ainda com sinais de desorientação.
    - Nas instalações militares do Amazonas, adentrou o projeto Oneirokronnos sem permissão. Você usou tecnologia restrita, se encontra internado em caráter de confidencialidade.
    - Minha consciência viajou no tempo, mas o mundo acabou. – Resmungou ele tendo um aceno positivo do oniricologista. – Nada pode impedir.
    - Não esperávamos que você retornasse assim. – Disse o médico. – Mas ficamos felizes de encontrar nossa primeira cobaia, de volta para casa.
    Hedi Ofir estava desiludido, também pudera seu mundo distópico era como o próprio pesadelo, envolto nas brumas de cinzas suspensas no ar eram como o ar pouco lúcido dos sonhos. O pouco do mundo civilizado que restou após aquela insidiosa invasão extraterrena que acabou com o coração pulsante da cultura humana eram construções entre as ruínas das cidades que transmitiam uma aura de nostalgia ao espírito humano que agora espreitava a vagar por cada esquina com suas máscaras de proteção. Restou a humanidade então usar os despojos da espécie alienígena para si, criando centros de recreação onírica coletiva, daqueles que na verdade queria fugir do pesadelo do real.
    Mas aquelas instalações no Amazonas, marco zero da invasão, onde um enorme hexágono cristalino extraterrestre caiu, eram realizadas as experiências pioneiras e sigilosas com a tecnologia alien, aproveitando-a muitas vezes para comercialização. A grande quantidade de dados capitalizada pelos cientistas ainda não tinha decodificação e sua língua era lentamente traduzida de modo que a história da espécie extraterrena ainda permanecia uma incógnita.
    Ofir fora vítima dos extraterrestres décadas atrás e depois fora estudado, com sua mente esquadrinhada pelos cientistas que usaram ele como igual cobaia para a tecnologia de além mundo. Mas aquele estado REM diferenciado excedia as duas horas de sonhos diárias de qualquer humano real, apresentando ao contrário dos quatro a sete sonhos do período um único e extenso sonho. Mas Ofir não era o único nisso.
    Mas quem era Sofia? Ofir ao levantar-se do leito viu o belo corpo de uma jovem de cachos dourados, como seu amor do passado, Corine. A jovem estava inerte num leito ao lado, de modo que ao perguntar sobre quem era Sofia o médico apenas apontou para ela.
    - Sofia se encontra nesse estado onírico em REM há décadas... que teve início um pouco antes da invasão.... Num único sonho como se ela vivesse outra vida. Um pouco antes indícios mostraram que ela sofreu da Síndrome de Morpheus igual a você.
    - Com o que ela sonha? – Indagou Ofir perplexo.
    - Com o mundo extraterreno. Mas não sabemos quando, nem por que. Mas aparentemente a sua contraparte onírica, Anil, está preso nesse mundo.
    Durante o incidente que sofreu Ofir, sua mente aparentemente fora dividida em duas partes, uma lançada no mundo onírico comercial da população sem que ele tomasse consciência e que se chamou Anil, enquanto a outra parte permanecia em si. Aquilo envolveu uma situação complexa que o levou até aquelas instalações num projeto chamado Onneirokronos.
    - Mas o que seria a Síndrome de Morpheus? – Perguntou ele ainda desorientado.
    - Síndrome de procedência desconhecida, apresenta um estado de consciência alterado e altamente sensorial mas que dá lugar a sonhos instantâneos e semi-lúcidos. Acreditamos que algumas pessoas sofreram disto como Nikola Tesla.
    - Nos referimos a ela como Síndrome de Morpheus. – Respondeu outro cientista cujo crachá indicava seu nome, Oriko Satori. – O mais intrigante seria o fato de que seus sonhos não seguem os padrões de um sonho normal. O cérebro humano por algum motivo que não conhecemos é programado para buscar padrões e paralelos que criem campos de previsão, mesmo nos sonhos as memórias normalmente são organizadas através da busca de referências cruzadas, mas que na Síndrome de Morpheus não ocorrem.
    - Isso aconteceu contigo. – Disse Shiro Soozoo, nome do outro cientista com ele. – Assim como com Sofia que tem aparentemente uma completa amnésia nos sonhos mas que curiosamente sonha com coisas que ainda irão ocorrer.
    - Outro aspecto está no fato de que os sonhos são o lado inconsciente humano. O inconsciente humano é dominado pelos instintos ancestrais, eles fluem melhor no estado onírico. – Seguiu Oriko - Os animais são mais tal lado inconsciente, de instintos, pois somente o ser humano possuí consciência. Porém, de alguma forma são sonhos lúcidos sem referências de instintos ou desejos a esmo assim como memórias.
    - Reconhecemos que a maior parte dos sleepners conseguiram adquirir a capacidade de sonhos lúcidos e manipuláveis, mas isso atinge outro patamar. – Concluiu Soozoo. - O pesadelo é na verdade o oposto de um sonho lúcido, quando você não tem controle algum sobre o que sonha. Por isso os sonhos induzidos nunca são pesadelos.
    - Talvez por que isso não seja meramente um sonho. – Respondeu Ofir ainda tonto por ficar tanto tempo adormecido. – São realidades, estamos confluindo através do tempo.
    - A hipótese da Dimensão dos Sonhos nunca fora confirmada. – Respondeu Soozoo colocando o palm sobre a cama. – Temos apenas indícios, como memórias de variáveis do mesmo sonho padrões inegáveis mas proibitivos para uma afirmativa do tipo.
    - Como se fossem dimensões paralelas? – Indagou Ofir olhando-se num espelho com a barba por fazer. - Como os refletidos nos espelhos do Hexágono? – Perguntou ele se referindo ao interior do chamado Sateoh que era uma espécie de indutor de sonhos coletivos.
    -O Criptomirror são espelhos digitais o qual a tecnologia ainda não deciframos por completo. Ajude-nos a compreender Ofir. – Disse Soozoo novamente - Temos relatos de um sonho o qual tecnologia similar a alienígena induzia sonhos agressivos em pessoas e culminava em violência, assim um outro sonho o qual uma pedra era capaz de ligar os sonhos a realidade. Todos eles eram circunvagados por sua parte adormecida, Anil. Pareciam os sonhos artificiais criados pela REM Inc. Isso foge a nossa compreensão de tudo sobre sonhos.
    Ofir que já estava permeado por dúvidas em demasia fora demais para ser capaz de assimilar. Mesmo que tivesse recém desperto o peso de seu pensamento remetia ao cansaço de quem estava acordado dias a fio. Mas os sonhos que verdadeiramente moviam Ofir eram os bons não os pesadelos o qual não tinha controle.

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