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sábado, 2 de abril de 2022

A Pós-Historia e a Ruína da Sociedade

Ilustração do Mito da Caverna de Platão.


Em homenagem ao dia 1 de abril publico esse trecho do livro 'Verbogonia'.

Foram inúmeros os processos dos avanços e refinos históricos, a medida da ampliação, detalhamento, objetividade e precisão das informações dos atos e fatos exteriores. O marco zero fora o surgimento da comunicação do qual a oralidade nos distinguiu dos demais seres. Todavia apenas com o advento da escrita a humanidade começou deixar registros ainda que permeados do adormecimento de mitos de sua cultura. Desse modo apenas com o advento da razão filosófica para o ocidente a história finalmente se emancipou da mitologia, ainda que registros anteriores pudessem fomentar esse despertar em sociedades diferentes. 

Disto o número crescente de registros burocráticos, das designações documentais de feitos e famílias tal como o surgimento e aperfeiçoamento dos sobrenomes a história fora ganhando contornos mais precisos que saiam das cavernas míticas como Platão aludia. Hoje a genética e a arqueologia amplia o horizonte e precisão histórica também a períodos da antiguidade como anteriores. Tudo isto quando finalmente a constante luta histórica da desvinculação etnocêntrica que prega a história escrita pelos vencedores, o maior e mais preciso avanço pode ser visto no fazer histórico annales que supera mesmo o fazer histórico marxista das lutas de classes. 

Ainda que hoje com o advento da internet global e da informática apresente pontos de retrocessos como a desinformação, negacionismo, fake news, relativismo, a falta de transparência, obscurantismo e adulterações, o agravo na pós-modernidade se dá pelo excesso de informação, ao contrário da antiguidade o qual o problema ocorre pela escassez. Associar atos e personagens que influem diretamente na história de um povo, da cultura e momento ainda apresentam enormes desafios por isto. Isto ocorre por uma série de fatores.

As informações exteriores, objetivas, ocorrem quando as ações criam ou modificam os objetos concretos e seus fatos adjacentes, ao contrário do abstrato que subjetivo é intrínseco a realidade interior que em dessincronia com o exterior gera conflitos e doenças psicológicas. Quando essa subjetividade coletiva, a exemplo da cultura, similarmente. Disso, como explicitado, todo conflito, guerra e crise de um povo surge de fraturas ou antagonismos entre etnias, classes ou povos estrangeiros por isso, pois a desigualdade surge do movimento gerado pelo atrito das diferenças pelas volições. 

A destruição da objetividade é outro processo deteriorante a sociedade levando apenas as volições individualistas do conflito de subjetividades e disso emergem elementos que alimentam uma antisociedade onde a identidade de um povo é fragmentada na substituição da identidade de grupos dicotômicos e radicais. A descaracterização da humanidade disso ocorre ao romper a cola que une a sociedade como espécie, o senso comum da cultura e a afeição empática entre indivíduos. Antes a dúvida e senso crítico ao ser voltado a esse problema, volta-se contra si mesma tornando ferramentas do pensar e saber armas. O signo das volições ao destituir a objetividade que perfaz a realidade é a linguagem dos ídolos (Francis Bacon) e arquétipos (Carl Jung) emergentes apenas das próprias volições que em suas subjetividades beiram ao pensamento mágico ao adormece-los como pesadelos nebulosos da obscuridade.

Ora, se as artes são o diálogo da subjetividade com a objetividade, do interior com o exterior, da individualidade com o coletivo a transcender a dialética, quando recíproco. As volições não sociais são ruídos da subjetividade sem diálogo, mas ataques que apenas produzem estes ruídos por signos entorpecidos por valores fracos a desembocar em poluições morais. 

Uma sociedade que ataca seus talentos, cérebros, vocações e aptidões produz apenas criminosos como inadequação ineptocrata. Assim as artes tanto como a filosofia estabelece os vínculos que perfazem uma cultura, dos tipos musicais, pinturas, literatura as tradições enquanto o oposto as desintegram a medida em que a linguagem é dissociada da objetividade para expressa-la. 

A arte assim é a subjetividade social compartilhada e convergente quanto cultura, as volições em ebulição o oposto, a subjetividade conflitante e divergente. Ainda que a primeira possa ser entendida pela segunda como divergentes entre si. Logo, a arte por ser parte da cultura permuta não apenas a identidade de um povo, mas parte da própria história enquanto o obscurantismo do oposto emergem como sombras do entardecer até a escuridão da noite.

Se os vaga-lumes  são lampejos nas trevas das volições que nunca pensam ou refletem, as sombras são as ranhuras obscuras da razão, trechos do horizonte de realidade e história não iluminados. O fim da história é a história sem autoria humana, como marxismo sem Marx, cristianismo sem Jesus Cristo, budismo sem Buda. A ruína da verdade é a implosão não apenas da história, mas epistemológica, ética e assim da justiça e sociedade. Não é possível haver obra sem autoria pelo mesmo motivo que não pode haver fruto sem árvore, uma aberração física e a fenomenologia da informação em toda sua causalidade.

Similarmente caso o presente plagie os erros passados está a se combater a experiência dele exercida se torna um sintoma comum. Essa promoção da destruição da experiência é intrínseca a da memória e história destituída da caracterização do progresso do Ethos, tanto como da alma cultural em si. E a destruição da identidade de um povo é a destruição do povo como o povo, onde apenas os erros se tornam tradições e as tradições sociais e culturais erros.

Ante isso o reducionismo sobrevivencialistas e o crescente menticídio torna ao individualismo que não preserva a individualidade, antes a substitui no arrebanhamento instintivo do povo em manada. Se da decodificação objetiva dos dados dos fatos nasce a história, a codificação desses ruídos é sua ruína. Disso a sociedade humana no que conhecemos de sua memória que é a história pode vir a se tornar um devir negativo da Pós-Historia como fim da própria sociedade. Os indícios da pós-modernidade ao evoluir a pós-verdade são fatos claros desse rumo a pós-história.


Trecho do livro "Verbogonia do Filoversismo" de William Fontana.


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