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domingo, 11 de janeiro de 2015

Mitologias, Sonhos Ancestrais

Toda mitologia parte de um princípio, a do homem em sua ignorância inocente em procurar compreender a essência e origem das coisas, que por falta de ferramentas e métodos entrega à Imaginação a tarefa de responder dando o poder de toda criação à deuses da fantasia que imanam da mente humana. O tenebroso ganha forma e a esperança personalidade, lições morais emergem para acalentar anseios e,  logo, toda um panteão surge rico em seres que povoam os pensamentos humanos em sua transmissão, normalmente oral. Por vezes surgem demônios que habitam os mitos em seu panteão, descritos como outrora deuses e hoje os responsáveis pelas coisas que somos afligidos.
Assim como ao paganismo toda iniciativa de um fenômeno natural era atribuído aos deuses, similarmente fazem as mitologias naturais a salvo a judaico-cristã. “A exemplo da grega mesmo o qual atribuem entidades mesmo aos ventos em suas direções como Bóreas ou Aquilão (vento do norte), Zéfiro ou Favônio (vento do oeste), Nótus ou Áuster (vento do sul) e Euro (vento do leste)”. Certamente o maior expoente dessa mitologia natural e pagã, é Pã o qual se atribuí um termo generalizado do mundo (pandemia, pansexual, pandemônio), tal como o próprio termo assim como o pânico por tal entidade provocar sustos em visitantes.
Mencionar que todos aspectos da mitologia parte da ignorância é uma opinião no todo grosseira e superficial. Toda mitologia nasce desse estado inocente e pueril, sim, que se torna fonte de religiões e culturas e mesmo seu ethos comum, fonte poucas vezes confirmada pela arqueologia e ciências mas que encantam pelas histórias emocionantes e personagens complexos. A medida que retrocedemos no tempo as histórias tornam-se mitos. Turvado pelas névoas do passado, a ausência de fatos os fortalecem no imaginário até ser revelado lentamente pela imparcialidade da ciência do homem, o que resta então, somente poderá ser a verdade.
A mitologia não é uma mera sucessão de relatos distorcidos e crenças, mas não tendo, necessariamente, compromisso com a verdade literal transmite conhecimentos complexos por metáforas fabulosas simples. Quando do passado e origem, mitos, quando do futuro profecias, pois um exemplo desse tipo de linguagem pode ser observado nas profecias bíblicas cercadas e dominadas por símbolos praticamente oníricos para transmitir conhecimentos de eventos vindouros. Nesse sentido a mitologia é a história adormecida, descrita por Graham Hancock como ‘ecos de nossos sonhos’, podendo, nestes casos, ser uma fabricação deliberada que sintetiza a cultura, valores e conhecimentos de um povo ou civilização, uma forma de imprimir o seu ethos e alma cultural de modo que se perpetue.
Inegável que na própria bíblia nem tudo são relatos literais de uma história sem registros físicos, mas das profecias e relatos de um passado nebuloso símbolos podem se mesclar a acontecimentos reais como sonhos.
A mitologia são sonhos vividos da alma coletiva, assim como outrora alguns sonhos peculiares me marcaram e inspiraram histórias o mesmo corresponde feedback literal. De sonhos em ilhas com ruínas engenhosas, a caixas misteriosas que desciam do céu pra mim e tormentas negras cujas sombras engoliam ao vazio os habitantes, os sonhos tem muitas características comuns com as mitologias, sendo tomados como proféticos e psicológicos. As mitologias são sonhos ancestrais de uma humanidade não desperta.
O meio acadêmico em sua ciência assombrosamente bela peca, porém, a compreender os limites do tempo, especialmente da humanidade – histórica ou biologicamente -, o qual torna-se, no mínimo, limitada a conhecer com verdadeira precisão o passado nebuloso da humanidade quando era povoada por seus mitos. Restando a ela, isto é, a história, tornar-se arqueologia e catar migalhas de um quebra-cabeças de milênios muitas vezes interpretado enganosamente. A este ponto não gozará do status de suas ciências exatas, mas praticamente interpretativas.
Construir uma mitologia, assim é um exercício o qual a linguagem simbólica especula origens, transmite conhecimentos e deduz o futuro através de uma cosmovisão ou alma cultural específica, exercício este tentado pelo autor, algo que a grosso modo hoje é chamado de ficção.
(...) Isso não seria possível por instrumentos científicos, mas apenas pela criatividade com um toque de fantasia, mas dentro da cosmovisão cristã de seus valores e mitos. Não expressam nesse sentido a alma coletiva, mas do autor, justamente nisso, em seus anseios, medos e convicções, por isso é parte simbiótica do autor. Naturalmente que a mitologia proposta deve ser vista com olhos do discernimento e sentidas pela compreensão pois traduz conhecimentos não literais.
Venho me empenhado, na prática e em leitura compreender os mecanismos das mitologias, algo que já fiz dentro de uma realidade atual através de livros como do ‘Universo diamante’ e 'Introversos’ e tantos mais. De Tolkien em sua mitologia do Um Anel à leitura de livros como ‘O Livro de ouro da mitologia’ compreender as diversas mitologias é compreender a melhor forma de transmitir conhecimentos e mais, conhecer melhor o ethos de um povo, época em seus medos e anseios assim como nossas próprias origens codificadas em símbolos e figuras heroicas, arquétipos e arquivilões. Construir uma mitologia, por sua vez, é traduzir a alma do mesmo em ficções que são realistas dentro de um corpo de conhecimento especifico. Algo que necessita de habilidade, dons e treino.

"A história é uma forma mais de ficção." 
Jorge Luis Borges

Prefácio do livro 'Crônicas de Pangeia' de Gerson Machado de Avillez

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