Disponibilizo gratuitamente para leitura o conto 'Rio Negro' de minha autoria. Parte integrante da antologia 'Devorador de Memórias', o conto de ficção científica ao flertar com o horror cósmico de Lovecraft trata de uma expedição as geleiras em degelo ao descobrir corpos de criaturas supostamente da criptozoologia que advindo de um rio subterrâneo leva expedição a mergulhar no desconhecido a se tornar o derradeiro ardil da equipe.
Aldair Nóbrega era um experiente biólogo que para sua tese de pós-doutorado viajou até a Groelândia custeado pela bolsa de pesquisa de Oxford e USP para pesquisar a vida de extremófilos. Sabia bem ele das limitações severas para a vida conseguir se estabelecer ou evoluir em condições extremas, mas seguindo rumores de vida abaixo da crosta de geleira ele prosseguiu sua pesquisa liderando uma equipe internacional ante um território extremo e assim hostil pra vida que era escasseada a medida de sua intensidade.
A princípio a pesquisa parecia infrutífera ao que poderia ampliar o campo de estudo da exobiologia, porém, após dois dias de tentativas malogradas dois habitantes vieram ao acampamento deles alardeados. Os dois estavam pescando na base da geleira quando um dia após o começo dos trabalhos da equipe uma série de criaturas bizarras desaguaram na superfície como fossem provenientes do oculto submerso das geleiras. Falando sua língua com forte sotaque, os experientes pescadores afirmavam desconhecer qualquer criatura similar vista por eles anteriormente. Afirmando serem similares a polvos as criaturas porém tinham membros humanoides e apesar de estarem mortas tinha altura similar a de um homem de 2 metros.
Aldair e dois membros de sua equipe seguiram ao local do achado imediatamente e após duas horas de caminhada fitaram vários moradores das redondezas ao entorno dos achados a beira do lago. Curiosos eles murmuravam alardeados sobre os incomuns achados o que era ainda mais perturbador para um homem da ciência como Aldair.
Ao examinar de perto o achado sabia se tratar de algo contra intuitivo a tudo aprendido na biologia com criaturas que em condições tão hostis ambientalmente não poderiam se estabelecer e muito menos evoluir. A perplexidade ao se tornar consternação parecia aludir um parentesco com os polvos o que fora confirmado geneticamente ao perceber que demonstrava ser uma árvore genealógica totalmente nova a teoria da evolução. Não haviam relatos na nomenclatura científica de criaturas tão diferentes geneticamente quanto esses seres, o que sinalizava uma origem totalmente diferente a dos demais animais.
Num exame mais apurado dos corpos perceberam haver sinais cefálicos muito mais complexos que dos polvos a se estender pelos membros que pareciam assemelhar-se aos braços humanos. A grande diferença era o fato do ser ter o que aparentava um abdômen que similarmente ao do ser humano detinham quatro membros análogos as pernas e braços, mas de modo mais elástico por não possuírem esqueleto o que lhe dava maior flexibilidade entre fendas e lugares apertados.
Logo, as pessoas lembraram dos personagens fictícios dos livros Cult de H.P. Lovecraft como seres alienígenas do porte de Ctchulu. Mas as ciências biológicas ainda que não sendo exatas não possuía margem para demasiadas especulações deletérias ao nível de lendas e mitos imaginativos da deliberada ficção ou não.
Precisava Aldair de mais fatos ante a consternação agora pública com o caso sendo exposto aos jornais e noticiários que logo ganharam destaque internacional. Não demorou para que americanos viessem e de helicóptero pousassem na geleira em meio ao acampamento da equipe brasileira e inglesa. Os suspeitos homens tinham credenciais duvidosas e intimidavam sob a constante pretensa de impor sigilo ante os novos passos tomados. Não havendo quaisquer reivindicações justas ou juridicamente cabíveis Aldair usou todos meios diplomáticos para tira-los do caminho pois como cientista o compromisso era ético mediante a exposição e análise imparcial dos fatos. Todavia, os homens esquisitos tinham uma cartada tentadora ao se dirigir ao Dr.Aldair.
— Temos recursos de tecnologia e financeira para uma expedição que localize a entrada do rio oculto que corre de dentro da geleira e fora aberto por vocês. Porém, caso não aceitem nossa oferta de seus serviços mediante nossos ditames suas bolsas de pesquisa serão canceladas e retornarão ao seus países de origem.
— Vocês não tem esse direito de impor-se contra a ciência desse jeito! — Reclamou Aldair ante sua assistente.
Porém, antes mesmo da réplica deles o telefone de Aldair tocou e para sua surpresa era a universidade de Oxford confirmando as ameaças daqueles misteriosos homens que tinha uma influência funesta e potencialmente conspiratória. Sem opções e mais tomado pela curiosidade a equipe aceitou as imposições sigilosas afim de deliberar a ocultação de dados de sua pesquisa ao público sob a promessa de seus diplomas e uma gorda recompensa afim de calar a boca deles por longos anos. Para todos efeitos eram eles agora cúmplices de uma trama ardilosamente internacional.
Após o término dos preparativos o submersível desceu as profundezas ante os olhos de curiosos vindo a desaparecer nas brumas caldosas daquele mar de águas escuras. No âmago das profundezas vagueou com fachos de luzes cortando a escuridão daquelas águas tenebrosas até que após a sondagem do sonar identificou a entrada por onde os corpos haviam saído. Havia uma corrente de água tangível com o evidente acelerar dos propulsores do submersível que adentrou a caverna feita de gelo ancestral, de milhares de anos.
— Essas camadas de gelo pré-histórico nunca foram acessadas antes, podem conter microrganismos conservados desconhecidos. - Comentou o doutor extasiado ao fitar as imagens de dentro do submersível.
Não havia lugar para todos da equipe dentro daquele módulo versátil de modo a permitir adentrar aquela caverna. Dentro apenas o doutor e sua assistente doutoranda e o piloto da navegação. Porém, a medida que avançavam a caverna parecia estranhamente se alargar enquanto descia sinuosa criando consternação sobre a procedência da torrente o qual o fluxo parecia misteriosamente vir de baixo.
Por ser contra intuitivo a emergente corrente logo desvelou mais corpos daqueles seres quando então o que remetia um corpo literalmente humano fora visto flutuando entregue as correntes.
Quando o submersível virou suas luzes o corpo girou em sua órbita e ao virar de frente o que viu-se deixou-os estarrecidos. Era um corpo humano sem olhos. Não possuindo nem as cavidades oculares aquele homem parecia ter nascido ou se adaptado a escuridão para que por gerações seus olhos não fossem necessários.
— Ou isso, ou desconheço alguma anomalia o qual o corpo veio parar aqui. — Comentou o doutor estupefato quando então fitaram o que parecia um bolsão de ar.
Ao emergir o submarino despontou ao fitar uma caverna dos quais séculos de goteiras formaram estalagmites dentre enormes cristais raramente encontrados. Ao redor formações naturais de salinas era iluminadas pelo reflexo das luzes nos cristais. Notando a vastidão da galeria o doutor pegou o cilindro de ar e abriu a comporta indo ao exterior com uma lanterna quando então fitou um vulto entre os cristais a se esgueirar.
Ao pisar em solo o doutor fitou dois corpos caídos. Ao lado de sua assistente Gianne logo reconheceram suas vestimentas como de um guerrilheiro vietcongue ao lado de um soldado americano!
A perplexidade do achado centenas de quilômetros de distância de sua origem e as condições eram mais que bizarras, mas contra tudo que ele poderia imaginar.
— Um soldado americano morto ao lado de um vietcongue tão longe do Vietnã? — Comentou Gianne perplexa. — Olhe eles estão de mãos dadas, o que faria eles abandoarem suas diferenças e se unirem?
— Não sabemos ainda, mas visivelmente morreram assustados. — Completou o doutor quando então abaixou-se e tirou de dentro de uma pasta um diário daquele americano que era um sargento. Ao abrir e ler as palavras percebeu o motivo do medo e susto deles.
O povo sem olhos parece ter evoluído como presas naturais daqueles polvos. Aparentemente não são extinguidos, mas caçados por gerações com margem apenas para se reproduzirem e criarem novas vítimas. Tais monstros atuam por debaixo da superfície e apesar de amistosos toda a cultura dos sem olhos fora construída sob a alcunha do medo, eles são literalmente nascidos apenas para sofrer e condicionados a morrer. Forças do mal que se contentam apenas com a destruição dos sonhos e direitos de suas vítimas, que atuam para trenar de modo parasítico tudo que não lhe é direito as custas de vidas destroçadas. Eles tem um poder de adentrar nossas mentes e fez com que uns matassem aos outros do meu grupo, restando apenas me unir a dois vietcongues que também se perderam nas vísceras do submundo onde eles são dominantes.
28 de abril de 1976
Fazem dois anos que ao adentrar aquela caverna nos perdemos. Um outros sobrevivente que parecia estar por aqui desde a Segunda guerra mundial contou coisas tenebrosas sobre as origens de mitos como do inferno de Dante, e cavernas que ecoam agourentos futuros fatalistas.
Nesse submundo que teria inspirado o Hades dos gregos essas espécies humanoides distintas as humanas por superpoderes sinistros. Mas o que contou o velho capitão americano a humanidade da superfície como conhecida teria sido originalmente fugitiva da servidão desses seres que se alimentam de nosso medo e penetram nossas mentes até quando dormindo ao inserir pesadelos insondáveis de coisas nunca vistas. Eles tem poderes de manipular mesmo a evolução de seres e por séculos controlam em segredo os poderes humanos tendo instruído pessoalmente os nazistas segundo os relatos do famigerado capitão. Mas ele morreu ao ser tomado por uma Síndrome de Saul e em seu epitáfio ao menos ficou feliz em saber que havíamos vencido os nazistas. Antes também, relatou a existência de uma piscina de memórias...
Fosse o que fosse aquilo ao terminar de ler aquelas páginas o biólogo consternado foi tomado por dúvidas tenebrosas sobre aqueles monstros quando arrepios e calafrios os tomaram ante a sensação de uma presença tenebrosa. Quando então misteriosamente o submersível submergiu e deixou os dois sozinhos lá. Gianne gritou em vão, o piloto como se tivesse sido controlado remotamente simplesmente fugiu restando a eles adentrar o complexo de cavernas e túneis seculares construídos por civilizações desconhecidas. Temendo eles resolveram fugir dali ao adentrar as galerias ante eles.
Temendo que as luzes das lanternas acabassem e sem compreender a origem do ar relativamente puro, logo tiveram essas dúvidas respondidas ao fitar plantas luminescências que parecia produzir tanto luz quanto oxigênio ao ambiente. Aproveitando o ambiente pararam após horas de caminhar e leram mais o diário. Logo, o doutor notou que a dita síndrome de Saul era uma variável da dupla personalidade com complexo de Deus onde a personalidade apresenta dualidade de sentimentos contra uma pessoa, sendo educada na frente e as costas desejando matá-la acreditando ser uma manifestação de um espírito iluminado. Nos relatos segundo constava pareciam ter sido colhidos da dita piscina das memórias referenciadas a localizada num mapa. Segundo o relato do diário tal lugar construído pelos 'antigos' afim de preservar a memória da humanidade usava um tipo de cristal líquido que parecia de alguma forma condensar memórias humanas por milhares de anos ao narrar os encontros daqueles seres que manipulavam humanos desde a antiguidade.
Ao caminharem sob as instruções do mapa, eles chegaram ao lugar após duas horas e o líquido luminoso irradiava uma tranquila luz azul quando eles viram um dos homens sem olhos falando um dialeto fonético desconhecido.
Ao se aproximarem logo entenderam o motivo do nome do lugar ao ter sensações que dela emanavam adentrando suas mentes como um tipo de arquivo akashico. A piscina dos Livros Vivos, era assim chamada pois as memórias são vida, o esquecimento e inexistência morte. Pois quando palavras carregam sentimentos passam a ser vivas. Logo, assim eles passaram a entender misteriosamente aquele homem sem olhos que era um tipo de guardião do lugar.
Lá encontram o diário de um expedicionário perdido. Diário de Um Bastardo Inglório que ao fugir dos nazistas ao adentrar alguma caverna da Europa descobriu que templos e religiões secretas eram criadas ao longo dos tempos para ter contato com os seres hominídeos e a troco de seguir seus planos tinham privilégios e impunidade no mundo da superfície logo se tornando elites de seus tempos. Mas focar nas memórias daquele logo sentiu as palavras surgirem em sua mente ao falar dos chamados Inpunisher, humanos dessas seitas que se venderam para obter o superpoder de romper a randômica capaz de fazer atrocidades sem consequências pra si contra a causalidade inclusive jurídica, antes obtinham poderes para reverter as consequências de seus crimes as suas próprias vítimas caso não aceitassem serem sacrifício aos lagrons como eram chamados os polvos dos quais os singelos e conhecidos polvos eram descendentes. O medo era denominador comum aqueles selecionados na superfície pelas seitas controladas pelos lagrons, sob os auspícios irrevogáveis de apenas sofrerem e serem destruídos.
— Eles moviam ciclos históricos humanos, alimentavam mitos, geravam lutas de classes e reduziam a sociedades a todo tipo de dicotomias como de presas e predadores, pois não aceitam a paz e a justiça. — Comentou Gianne caindo de joelhos ao fitar o sacerdote sem olhos quando então visões lhes sobrevieram.
Primeiro mostrou como os primeiros perderam os olhos ao passarem tirar estes literalmente para tentar escapar as visões aterradoras que os lagrons lhes compeliam, e após fora tomada por medos tenebrosos do que seria vindouro, uma reversão total da espécie humana ao ser reduzida a ratos e gado enquanto os ratos seriam transformados pelos lagrons em seres inteligentes e dominantes a escravizar os humanos em seu nome.
Chorando ela deitou-se vindo se aninhar em si mesma como um feto como se tivesse regredido aos instintos infantis ao ser carcomida como pela soma de todas as aflições humanas. Naquele momento então o doutor virou-se e viu que estava diante de um dos lagrons de modo tardio. As mentes deles foram possuídas e eles não pertenciam mais a si mesmos. Finalmente entenderam que toda expedição fora na realidade engendrada apenas para entrega-los aos seres e acobertar todas as descobertas.
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