Inicialmente eu, Liziane, pensava que algum leitor descuidado houvesse esquecido aquele livro ali, no banco de espera do terminal ferroviário. Todavia, mesmo eu sendo leitora assídua nunca havia falado naquele livreto incomum. O nome era Fatum Libro, um latim que significava algo como 'Livro do Destino', fatum que também por esse motivo servia para designar algum fato. Como estudante de filologia sabia com o que lidava, mas aquele autor muito menos conhecia, um tal Milliaw Onofato. A curiosidade que me sobreveio fora previsivelmente avassaladora ao levar-me abrir o livro o desfolhando prontamente. Logo na primeira página ela viu a descrição do que seria ela mesma sentada naquele banco, perplexa fitou com maior acuidade o que lia temendo ser uma apofonia de sua mente. Porém, não era, pois ao seguir a descrição ela perfilou os detalhes do ambiente escritos a rigor, incluindo uma lata de lixo onde o texto dizia haver um jornal do dia anterior com um chip preso a fita adesiva. O texto assim dizia:
"Ela então tentada ao ler o estranho texto em mãos se levantou e fora em direção a lixeira descrita em questão. E ao remexer o lixo notou haver de fato o jornal descrito nesse texto."
Liziane fez exatamente aquilo, exatamente conforme descrito no texto que descrevia a si mesmo através dela, após começar a ler dizendo: "Certa vez, uma pessoa ao aguardar um trem sentou-se no banco quando se deparou com um texto que curiosamente descrevia exatamente isso que ela fazia."
Estupefata ao abrir o jornal desvelou o chip numa fita adesiva que prontamente fora retirado por ela afoita. Assustada ela ruborizou, virou para os lados e temendo estar sendo filmada ou ser algum tipo de paranoia, quando então ela leu no texto antes de prosseguir a exata atitude que acabara de fazer. Ela tremeu nas bases, se sentia usada e destituída de seu livre arbítrio, como um peixe preso no ardil de uma isca que inexoravelmente levaria a ser fisgada. Chegou a pensar em colocar o chip no celular, mas temendo ser algum tipo de vírus jogou de volta no lixo e partiu a largos passos quando recordou-se ainda estar com o livreto, e o abriu ansiosa e, tentada, o que leu a deixou consternada de sobremodo.
"A pobre pessoa temendo ser um golpe largou o pacote do chip de volta no lixo e partiu a largos passos, assustada, quando lembrando-se do texto o abriu e isso leu."
Ao terminar aquilo ela transpirando de medo se rendeu. O livro mágico parecia exercer algum controle sobre ela, contra seu livre arbítrio ou era capaz de prever minucias de seus movimentos de modo milagroso. Ela virou as páginas desesperadas para saber o que haveria a frente e via perseguições de um homem que parecia coagia-la levando-a. Aquilo a fez varejar o livro longe para quando se virou deparou-se com um homem alto e caucasiano, de sobretudo, exatamente como descrito. O sujeito tenebroso e de olhar fixo apontou para o livro em silêncio exigindo que o pegasse. Tremendo ela o fez e quando o pegou recomeçou a ler a página na ordem em que havia começado, e para sua surpresa descrevia exatamente o que havia feito, sendo seguido pelo seguinte parágrafo: "desesperada ante o homem suspeito, se ela agora tentasse se livrar do livro, ler novamente a frente, ou fugir do homem, iria fatalmente ser morta restando a ela apenas seguir a leitura de sua própria vida nessa brochura."
Seus olhos ficaram mareados e brilharam sobre o tremor de suas mãos, segurou os prantos e ao ver uma senhora do lado a chamou falando que aquele homem estava a coagindo por causa do livro, mas ao ouvir aquilo o homem se aproximou delas e disse.
– Estou apenas orientando essa senhorita perdida ao destino que lhe apraz. Parece ser desorientação mental ao saber que não tem controle sobre as próprias ações. Peço perdão a senhora.
– É mentira! – Vociferou ela e continuou – Ele plantou esse livro que parece saber de minha vida, é um voyeur que sabe tudo o que vou fazer!
A senhora ao ouvir aquilo gargalhou e deu uns tapinhas no ombro do homem pálido que a retribuiu com um sorriso sombrio. Achou graça irônica do absurdo que se desdobrava.
Piscando os olhos nervosamente ela fitou a página e viu o dialogo exatamente descrito por eles. Quando ao ler o passo seguinte era o que exatamente o homem iria dizer-lhe.
– Siga as instruções do livro e pegue o chip para por no celular.
Liziane, pálida de nervoso, deu-se por vencida e assim o fez, seguindo ao lugar de onde veio enquanto lia o livreto. Pôs o chip no celular quando então algo o infectou e acionou os alarmes dos caixas eletrônicos. Logo os seguranças correram até ela que fora rendida sob os olhares do homem esquisito. Rendida e algemada no chão ela se remexeu e ainda moveu uma página que a levou aos prantos notar a exata descrição de tudo que acontecia. A mulher, que era negra, fora levada arrastada pelos seguranças enquanto uma viatura encostava com eles dizendo o que ela acabou de ler.
– Finalmente prendemos a suspeita por invasões hacker aos caixas eletrônicos.
O livro caiu de suas mãos e o homem de preto se aproximou lentamente do livro caído no chão, e ante os olhares de curiosos que se avolumavam ao redor, o guardou no bolso. Acionou uma escuta e se afastando do local disse.
– O indutor de influxo de eventos da ancora do destino parece funcionar ao minimizar o livre-arbítrio humano as menores variáveis. A indução de paradoxos pode finalmente nos dar controle total e absoluto sobre a humanidade.
Não vindo a se tratar de um trote ou alguma forma de manipulação, o livro na verdade leva a um experimento cruel sobre o destino. O homem sentiu-se extasiado em participar desse cruel experimento que condenava pessoas aleatórias a destinos a revelia amarga, isso até quando o próprio abriu o livro e leu o desfecho.
"O agente então sentindo que seu dever no experimento estava cumprido, sentou-se no terminal e abriu o livro para ler este final, sem saber que uma dor iria o acometer no peito levando-o fatalmente a morte por infarto, para que assim não restasse suspeitos envolvidos no caso.”
Ao ler aquilo o homem ficou tão furioso e amargo que o mesmo lhe ocorreu levando-o ao dito mal súbito fatal.
O experimento liderado pelo cruel Álvaro Watchman, sob instruções de documentos de um certo Tratactus Ad Tempus usava postulados sobre a teoria do caos o qual o pseudônimo aludia, desejava tornar os rumores de uma variável gerada num livro chamado Fakebook real como estudos das relações de caos, livre-arbítrio, destino e realidade. O sádico velho se regozijava do experimento que escravizava o trabalho intelectual de vários gênios. Ele agora se sentia Senhor do Destino por rouba-lo, como ao livre-arbítrio de suas vítimas tornando-as todas apenas mais "uma" dentre tantas vítimas. Aquele era o livro do destino, uma prisão a liberdade humana.
Conto da antologia "Verboversos" de William Fontana.
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Que maluquice!
ResponderExcluirGostei :)
Me lembrou o "Death Note".