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sábado, 24 de outubro de 2015

Capa de 'Todas As Formas de Sonhar'.

Capa da antologia 'Todas as Formas de Sonhar' de Gerson Machado de Avillez. O livro agora reúne em forma de contos os livros 'Underidion', 'Além do Universo' (renomeado para 'O Livro de Zakar'), 'No Tempo dos Sonhos' e 'Onde as Borboletas Dormem'. A Antologia que tece uma relação entre todos seus contos ao final trata de um mistério onde algo incomum há neles, o livro ainda inclui os contos 'A Volta do Ponteiro' e 'A Caverna das Memórias Póstumas', o livro, no entanto, não tem relação direta com a série 'Adormecidos'. Olhem a capa abaixo, clique para ampliar.


quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Paradoxos da vidência

Compreendemos haver vários tipos de viagem no tempo, inclusive viagens mentais, de consciência, onde o qual informações precisas vem ao conhecimento do viajante que é conhecido, nestes casos como vidência ou precognição.
Sendo assim um vidente prevê o que evita ou induz o que vai acontecer?
Dois videntes com iguais poderes se encontram e cada um prevê o que o outro vai falar, o que eles falam?
Dois videntes com iguais poderes jogam xadrez um com outro, qual ganha?
As proposições ainda que sejam inválidas pela ciência convencional a exemplo princípio de auto-consistência de Novikov servem para "provar" filosoficamente que a viagem temporal é intrinsecamente uma viagem transdimensional, ou seja, para mundos paralelos a partir do conceito de variáveis de paradoxos que são curtos na lógica envolvendo seres oniscientes em similaridade com o demônio de laplace. O "curto" lógico acontece pois os "precognitores" ao se encontrarem são como espelhos um diante do outro a dar um eco infinito de previsões variáveis por refletirem-se mutuamente ao infinito. Assim se cada um preferir falar o que o outro prevê, iriam ficar calados. Similarmente ao jogo de xadrez onde ambos literalmente poderiam sofrer de narcose temporal ao ter precognições. Mas a evidência, que será nestes casos sempre subjetiva dependendo da percepção individual deles um verdadeiro vidente assim pode prever normalmente o que somente irá acontecer em dimensões paralelas uma vez que impedir a concretização de suas previsões implicará em ser taxado de que seus poderes não existem assim como seu oposto ao induzir os acontecimentos da evidência o levará a ter um poder inútil. Qual se prefere?

terça-feira, 20 de outubro de 2015

Conto: A Volta do Ponteiro

O conto 'A Volta do Ponteiro' presente na antologia 'Todas as Formas de Sonhar' é satírico em sua critica a filmes sobre loops temporais ainda que utilize-se das mesmas regras postuladas nos livros do autor sobre viagens no tempo. Abaixo disponibilizo o conto completo:

A terra precisa de 365 dias para realizar um completo movimento de translação, de modo que cada dia representado como o movimento de rotação demora cerca de 24 horas, as horas que num relógio analógico é divido em PM e AM, a cada 12 horas repetindo-se. O mesmo segue para as épocas do ano, do solstício ao equinócio calendários que marcam ciclos num universo cíclico para pessoas cíclicas formando um círculo sem fim.
          Assim que o habitual relógio analógico de estimação daquele imenso laboratório ultramoderno marcou 6:37 adentrou pelas portas um jovem num jaleco que aparentava desajeitado. Segurando uma bolinha nas mãos com seu cabelo desgrenhado parecia um estranho em trajes estranhos. Fora quando encontrou outros homens em jalecos brancos quase perdendo-se entre eles, quando um dos quais se destacou num sobretudo e óculos escuros ainda mais estranhos.
 
          - Sim, são 6:37, hora estimada do começo do experimento 6.20 espiral. – Disse um dos homens de jaleco que continuou. – Que se abra o portal. Quero cada fluxo de dados e movimento realizado registrado no banco de dados, nem uma mosca deve escapar de ser mencionada. Lembre-se no caos mesmo uma molécula faz diferença.

          Uma coluna de luz emerge de um espaço vazio entre os homens de jaleco, numa profusão toda imagem que passa por ela parece estilhaçada como num espalho quebrado, distorcido dentro de águas. Fascinado o estranho de jaleco deixa uma pequena bolinha cair ao chão e rola por entre os pés dos demais homens de jaleco branco até parar no homem de sobretudo que se abaixa e pega a pequena esfera na mão e sorri.
          A forma primária mais essencial do universo é a esfera, rompendo a inércia surge do giro, assim como há a rotação de um planeta redondo e azul nomeado Terra, Terra que é achatada nos polos. Assim como a transladação, pois redondos nos giros, e giros dentro dos giros. A forma natural, pois, mesmo as ondas tendem aos formatos circulares ante um universo onde tudo são ondas e informações, o círculo, o giro e a esfera são louvores diferentes da mesma onda em interação que é o universo. O universo onde giro, círculo e redondo são lei, e a inércia, assim, não pode ser tão inércia, há a aberração, onde mesmo a reta se curva num universo que apesar de plano se expande redondamente como uma onda num multiverso cruzado.
          Mesmo a reflexão é o ondular, a volta de um ressoar pois tudo que há de voltar é redondo. Do colher o que plantar e de todo retornar, são as únicas leis no universo. Uma vez dito isso o homem sorrindo pelo imprevisto a guarda num bolso e segui em direção a coluna de luz agora em espiral como em ciclos que se engolem e a adentra. O nome dele era Jordan Kimberley, mas na missão era apenas conhecido pelo codename “Zack”.
          O homem rompeu as vísceras do tempo cortando os grilhões que seguravam a linearidade temporal em sua intrínseca relação com o espaço, fracionou o tempo em cacos caóticos a ser observados linearmente por sua base, aquele laboratório embranquecido e arejado. O experimento? Uma situação criada a fim de extrapolar um paradoxo temporal cíclico como meio de observar os desdobramentos de eventos assim como entropia no caos como modo de estipular quais são os eventos síncronos ao fluxo do paradoxo e como eles se espalham aleatoriamente no caos.
          Quais eventos são fixos ou flutuantes e aleatórios a cada repetição do ciclo paradoxal? A que direção ruma os eventos apresentados dentro do fluxo do paradoxo central que move a repetição de tempo não perceptivo a testemunhas inerente ao ambiente caótico? O caos tem uma relação intima com o tempo, e Zack era a cobaia a fim de testa-lo no ciclo vinte do paradoxo cíclico seis.
          O lugar era uma cidadela aconchegante sem grandes problemas sociais, mas que por um achado ligava os eventos vindouros ao passado e os eventos passados ao vindouro. Zack tratou então de procurar o cidadão que teria encontrado o relógio que soterrado pela singularidade que curvou o espaço tempo teria supostamente sua consciência desperta para a realidade de repetições cíclicas. O primeiro ciclo a sensação comum de estranheza seria equivalente a um de javu como se fosse uma noite mal dormida, mas gradualmente se acentuando como se fossem ecos de si mesmas antes de repetirem-se até que no ciclo vinte, aquele o qual se encontrava, a repetição de eventos tornava o oriundo desperto numa espécie de profeta do destino conhecendo gradualmente as nuances e acontecimentos subsequentes a cada interação na tentativa de alterar o curso de eventos antecipados por ele.
          Zack adentra um restaurante e avista o dito homem chamado Orson Calbot, este imediatamente olha para Zack vendo-o como uma peça sobressalente naquele ambiente plenamente previsível a sua consciência desperta, como se fosse um fator surpresa inesperado.
          Compreendendo que a ciência temporal era física com sangue de filosofia, Zack imaginou que Orson estava pensando sobre qual evento de modificação temporal fez com que Zack surgisse em seu ‘mapa profético’ como fator inesperado. Investiga todas as variáveis e atitudes possíveis no restaurante mas Zack tendo apenas aquela pulseira discreta como um rolex observa que desdobramentos sua presença inesperada tem no ambiente mediante o sistema complexo da teia de eventos do caos.
          Imediatamente Zack percebe quais eventos flutuam com sua presença e quais permanecem fixos após sua interação local. Um casal passa por ele e senta-se atrás da mesa de Calbot pega o cardápio com a mulher e Calbot mexe os lábios no ritmo e entonações das palavras do homem que diz.

          - Hoje vou pedir algo diferente, vou pedir arroz a lá grega.

          Um acerto. Calbot observou que o casal era evento fixo mediante as modificações de interação indireta, isso significava que a menos que houvesse uma interação direta sobre o casal o comportamento deles seria o mesmo dos ciclos anteriores. Mas Calbot não tira os olhos do homem que senta-se ao seu lado, Zack e para seu nervosismo Calbot não fazia a menor ideia do que esperar dele.
          A teoria era complexa em informação mas completamente simples em composição, os ciclos se desdobravam por uma lateralidade dimensional ou seja, a cada repetição os eventos se sucediam em dimensões paralelas muito similares de modo cumulativo e indefinidamente. Isso porque os eventos de uma linha temporal nunca poderiam ser alterados, poderia-se apenas alternar a linha de eventos ligeiramente modificados a cada escolha sucedendo paralelamente outras dimensões similares por combinações variavelmente diferentes de eventos sem que a percepção se desse conta. A sensação de repetição é apenas pertinente ao viajante, oriundos nunca despertam, mas não Orson Calbot. Zack estava lá para dentre outras coisas isso responder, porque.

          - Bom dia. – disse Orson arriscando alguma interação como se cada palavra saída de seus lábios pudessem ter desdobramentos imprevisíveis pelo simples verbo.
          - Bom dia, observo que você vem sempre aqui. – Disse Zack arriscando-se.
          - Apenas hoje. E hoje parece um dia sem fim. – Resmungou Calbot. – Mas de repente você me parece um fator surpresa.
          - As segundas-feiras sempre são mais longas. – Sugeriu Zack – Graças a percepção humana mediante a perspectiva de uma longa e chata semana pela frente.
          - Quem é você? – Não resistiu Orson Calbot – Como sabe de que...
          - Toda a segunda-feira você senta aqui? Ou melhor toda essa única segunda-feira?

          Num misto de alivio por perceber-se que não é o único a sentir-se um louco Calbot virou-se para Zack e perguntou que ele era, apresentou-se e Zack a ele com seu codinome.

          - Acho que passamos do ponto de falar de profecias e adivinhações. – Disse Orson Calbot para Zack quando a garçonete tropeça e deixa cair no chão um copo de suco de laranja que se esparram pelo chão e cacos. – Você não era para estar aqui, o que você quer?

          Ante a sequência de eventos Calbot revira os olhos ao notar que um homem passa a mão no traseiro da garçonete ao abaixar-se para pegar os cacos, mas um evento fixo no fluxo cíclico.

          - Do que trata-se tudo isso? Algum tipo de jogo? Alguma simulação ou teste? – Indaga Calbot. – Vinte vezes vi esses eventos variavelmente e somente agora você surge como fator surpresa.
          - Mais ou menos um teste.
          - Quando perguntei quem era você, não perguntava seu nome.
          - Sou de uma agência intemporal e dimensional que investiga fenômenos únicos na linearidade temporal. Somos a Tempus.
          - Onde toda vez no final do dia eu morro para voltar ao começo do dia e passar por tudo de novo? É algum tipo sofisticado de tortura ou um eco da morte?
          - Queremos compreender porque alguns eventos são fixos e outros não assim como porque sua consciência despertou a realidade cíclica dos eventos e não os outros. – Respondeu Zack. – Viemos aqui para ajudar-lhe.
          - Acho bom, pois estou cansado de morrer. Isso é traumático cara, tem ideia? Isso tudo é uma insanidade sem fim.
          - Cada evento fixo modificado diretamente altera o rumo do fluxo da espiral de eventos mas não sua convergência final que culmina em sua morte.
          - Nem assim diz algo que não saiba. Já fui profeta, já fui vidente, já fiz de tudo nesse lugar maldito e previsível! – Terminou Calbot gritando dentro do restaurante e então ele abaixou-se ao se ver observado e diz num burburinho – Pronto agora o caminhoneiro virá até aqui e me mandará calar a boca.

          O caminhoneiro levanta-se com um boné azul e um colete amarelo coça a barba e segue até a mesa deles e fala.

          - Cala boca idiota.

          O homem retira-se e Calbot resmunga algo sobre o que aconteceria caso ele revidasse as palavras do caminhoneiro, tomaria um soco e um moleque gordinho do outro lado do restaurante iria gargalhar da chacota de Calbot. Mas quando nada é feito o gordinho se engasga e assim acontece. Zack consulta sua pulseira de medições de quanticometria e respira fundo quando então Calbot vira-se para ele e diz.

          - O mais incrível é que tudo converge com minha morte, tem algum modo de livrar-me disso?
          - Esse o fluxo de destino da espiral, chamamos de fluxo fixo de eventos negativos. Tem que compreender que se sair contigo daqui a gora...
          - Um carro perde o controle e me atropela me esmagando num poste. – Concluiu Calbot tendo um aceno de concordância de Zack.
          - Você está como uma mosca numa teia de aranha, só que teia de eventos, cada movimento seu nessa teia caótica atrairá a aranha do destino para você. Quanto mais se mexer nessa teia mais estará nela enroscado.
          - Que bela analogia. Isso redefine todo sentido da vida. – Respondeu sarcasticamente.
          - Você tem a consciência desperta pois de algum modo quando os eventos convergem em sua morte memórias de sua consciência varam o continuo espaço-tempo voltando ao ponto de início, as 6:37 da manhã. Um paradoxo, normalmente, somente é percebido por quem está de fora do paradoxo. – Disse Zack ao finalmente receber informações de seu leitor no pulso identificando parte do problema. – Há eventos fixos no fluxo de destino com graus de intensidade, sua morte é o evento mais fixo de todos, ou seja, a base desse paradoxo. Um armadilha temporal.
          - Sabe, acreditava que toda essa coisa de clichês recontados indefinidamente no cinema e em séries era mentira, do filme ‘Feitiço do tempo’ a ‘Meia-noite e um’ ao ‘No Limite do Amanhã’ perdi a conta de episódios de séries como até Arquivo X narra isso, um clichê relatando clichês.
          - Ciclos dentro de ciclos. A cada volta do ponteiro...
          - Também não quero terminar o dia louco... e morto! Até enfartar enfartei. – Cortou Calbot o que dizia Zack.
          - Fique tranquilo estamos aqui para ajuda-lo. Compreendemos sua frustração infelizmente você é um efeito colateral.

          Calbot não sabia como agir, já havia morrido assaltado, atropelado, infartado, numa briga com o caminhoneiro de boné azul, se matando, sendo morto pelo marido do casal ao lado deles, sentia-se como se estivesse caminhando equilibrando dois quilos de nitroglicerina onde o menor movimento implicaria na sua morte, era um refém do tempo e do destino. Eram voltas em loop, tantos loops que suas memórias iam se somando em sua mente de modo a criar uma gradual sobrecarga em seu córtex que para Zack era uma versão atenuada de narcose temporal.

          - Vou ficar aqui o resto do dia parado – Disse Calbot.
          - Não, sente o cheiro de gás? Se você ficar isso vai explodir pois o caminhoneiro vai resolver acender seu tabaco.
          - Dane-se tudo isso! – Gritou Calbot levantando-se e virando a mesa. - Quero ver o que vai me matar dessa vez!

          Todos olharam a sua volta nervosos e ficando em silêncio ante o surto de Calbot, mas quando ele saia do lugar uma batata frita que estava na sua mesa e caiu no chão o fez tropeçar e cair de cara na faca que caiu da mesa. Simplesmente fora fulminante.

Ciclo 21 do paradoxo 6
Zack adentra novamente o restaurante e Calbot avista Zack e remexe os olhos o reconhecendo. Zack tenta esboçar um sorriso para ele como se fossem velhos amigos. Zack era o negociador com o destino para libertar o refém do tempo que era Orson Calbot, mas ele parecia pouco se importar ou estar feliz por aquilo. Tudo era cansativamente surreal.
          O casal adentrou o restaurante e então o homem sentou-se atrás deles e disse.

          - Hoje vou pedir algo diferente, vou pedir arroz a lá grega.
          - Isso é ridículo. – Resmungou Calbot com Zack que sentou-se. – A faca no meu olho doeu cara, não faz ideia. – Mas o mais ridículo é ver esse cara todo dia pedir a mesma coisa como se fosse algo diferente do todo mais.
          - Isso segue à risca a teoria da perspectiva. Para você os eventos são cíclicos, mas para ele a linearidade segue como um dia qualquer em sucessão aos demais. Para ele houve um ontem, para você seu ontem é hoje.

          A cada volta do ponteiro no relógio a situação parecia mais surreal.
          A garçonete veio e deixou cair o copo de suco de laranja no chão, ela se abaixa para pegar os cacos e um cara passa a mão no traseiro dela. A mulher esboça um sorriso sem graça e com raiva levanta o dedo da obscenidade quando o patrão olha, e então muda de atitude disfarçando.

          - Sou um segregado do tempo. – Resmungou Calbot – Se morrer dessa vez certifique-se de que morri de vez.
          - Tenho novidades. Conseguimos alterar o fluxo do evento central. Sua morte. Aparentemente a cada ciclo os eventos se intensificam por estar em voltas mais acentuadas nessa espiral, a convergência em si é o próprio fenômeno de singularidade que leva a sua simultânea criação. É como um engasgo no tempo.
          - Vamos ao que interessa, vou viver?
          - Acho que temos uma brecha, quebrando o evento central de sua morte quebramos o vórtice e consequentemente os ciclos do paradoxo se dissolvem restando apenas em sua mente como uma memória, como um sonho muito estranho. Mas mudar o rumo dos fluxos já considero ótimo sinal.
          - Mas qual a causa? Minha morte é simultaneamente o efeito e causa?

          Zack balançou sua cabeça concordando. De algum modo a morte de Orson Calbot era uma anomalia de modo a convergir nela mesma numa falha temporal, culminando num destino negativo, o científico eco da morte. Mas tinha um pivô.

          - Cada morte sua, na verdade sua consciência salta a uma dimensão paralela numa variável de narcose temporal a condicionar os acontecimentos, ou seja, sua mente tem uma relação com os eventos pressentidos. Mas as variáveis na realidade são iniciadas por uma fração de defasagem num relógio, o relógio desse restaurante.
          - Como assim? O relógio estava com defeito?
          - Na verdade detectamos que o fluxo de eventos de efeitos são causados por um parafuso solto dentro do relógio. De modo que se ajustarmos ele não dará lugar a variáveis dimensionais ou seja, tornando essa dimensão a fixa. Naturalmente que tenho acionado um fixador dimensional por ancora do destino ao meu sistema com a base da Tempus.
          - Não me importa o que você está dizendo, quero que isso acabe de ficar acabando. – Murmurou Calbot quase esboçando um sorriso. – Quero o fim dessa piada cósmica com minha vida e morte. Chronos deve ser muito ocioso.

          Zack levanta-se e vai em direção do relógio na frente de todos, estica o braço após observar sua pulseira e pega o relógio até ele. Sorri quando então o patrão da garçonete surge lhe apontando uma arma para Zack.

          - Largue isso. Estamos cansados de arruaceiros. – Disse o homem obstinado e decidido.

          Orson Calbot levanta-se e chega por de trás do homem que se assusta e ao virar para ele sem querer dispara a arma sobre Calbot bem no meio de seu peito. Calbot cai no chão duro, morto. Consertar o relógio não vai ser uma tarefa tão fácil assim.

Ciclo 22, paradoxo seis
Calbot está com cara de poucos amigos sentado numa mesa quando adentra o casal e logo após Zack que lhe sorri acenando com a mão, Calbot era oficialmente o homem mais experimente e morrer do mundo, conhecia todos os sabores das mais variadas mortes. Com olheiras Zack o viu e sentou-se ao seu lado sem esboçar qualquer emoção quando por dentro estava em ebulição.

          - Sabe já não sei mais discernir o que é sonho e realidade. – Murmurou Calbot.
          - Vamos, você não morreu tão mal da última vez. O tiro chegou a ser digno. – Tentou arriscar Zack com algum humor mas um silêncio sepulcral veio de Calbot como resposta. Talvez ele estivesse morto desde a primeira vez. – Como você está?
          - Morto? – Respondeu Calbot novamente, mas não se dando por contente seguiu - Sentindo-se como uma boneca de porcelana. Penso em colocar uma placa de frágil.

          Por um instante Orson Calbot deu-se conta que ele fez mais uma vez humor sarcástico com si próprio, afinal toda situação parecia um bordão de uma sitcom norte-americana, mas escrita por Douglas Adams.
          O fato é que testes e analises foram feitas de todas as variáveis caóticas num mesmo tempo paralelo para determinar por meio de diversos tipos de monitoramento e determinou que exatamente as 11:29 da manhã de acordo com o dito cujo relógio a falha acontecia saltando variáveis de acordo com a menor variação de posição do parafuso solto do relógio. Era 11:20 e se Zack conseguisse corrigir aquilo, colocando o parafuso em seu devido lugar as variações dos ciclos espirais diminuiriam sua intensidade, justamente a brecha almejada por Zack. Assim o agente temporal sorriu para o gerente do restaurante o chamando.

          - Os senhores já foram atendidos? – Perguntou o gerente como se nada tivesse feito anteriormente, no ciclo passado.
          - Na verdade o que quero não está no cardápio. – Disse Zack sugestivamente – Sou um colecionador de antiguidades e notei que o senhor tem aqui um belo e raro exemplar de relógio. – Arriscou. – Quanto o senhor daria naquele relógio? – Completou com um doce sorriso sua pergunta ao apontar para o relógio.
          - Não está a venda senhor, ele está na família a três gerações. – Respondeu o gerente tentando esboçar um sorriso.
          - O senhor se incomodaria e poder vê-lo? – Insistiu Zack quando então...

          - Na verdade sim.

          Calbot engoliu seco, viu novamente as altas probabilidades dele morrer subirem altamente quando então a garçonete passou por eles e deixou o copo de suco de laranja cair no chão se espatifando.
       
          - Preste mais atenção. – Disse o patrão ao lado deles.

          Naquele momento o homem passou a mão no traseiro da jovem quando ela ia abaixando-se para pegar os cacos. Mas a mulher dessa vez virou-se e deu um tapa na cara do homem que levantou-se furioso para socar a cara da jovem garçonete. Uma variação nos eventos do fluxo de acontecimentos, pensou Zack e Calbot.
          Zack levantou-se e antes que o homem socasse a cara da jovem segurou-lhe a mão deixando o homem transtornando com seu machismo prestes a explodir.

          - O senhor deveria melhor dar condições as suas funcionárias. – Arriscou Calbot olhando para os lados com medo de um tiro, um carro subindo a calçada.
          - Não precisa. – Disse a jovem. – Eu me demito, e vou denunciar o assédio moral e sexual que você me deu. – Completou ela virando-se para o patrão. – Não sou um objeto.

          O homem olhou sem jeito para os lados tendo todos os clientes observando e então resolveu dizer algo para que ela se calasse, eram 11:25 da manhã.

          - Ora, que exagero, o que você quer que possa suprir suas necessidades?
          - Aquele relógio pois vi vocês falando que vale muito. – Disse ela apontando para o relógio enquanto ajeitava um cacho de cabelo dourado que caia diante de seu rosto.
          - Mas... – Tentou retrucar o patrão em vão.
          - Ou vou ter cada um de meus direitos trabalhistas e um belo processo nessa espelunca.

          Calbot e Zack viram naquilo a oportunidade de ouro faltando apenas poucos minutos, enquanto o patrão ia até o relógio e o pegava para ela. A jovem o pegou e então abriu-se um sorriso iluminado no rosto de Zack que lhe arriscou.

          - Posso abri-lo para verificar se é original, todas as peças são verdadeiras. Sou relojoeiro. – Disse o homem quando então a jovem lhe sorriu a assentiu.

          Calbot olhou para as horas, eram 11:28, aquilo parecia uma bomba, ops, relógio. Zack tirou os parafusos laterais sob os olhares deles e então mediu algo com a pulseira e identificou o parafuso que movia-se lentamente com o mover dos ponteiros. Faltava poucos segundos quando ele o apertou para o alivio de Calbot que olhou para os lados e sentiu-se ainda vivo.

          - Tudo original, só apertei esse parafuso porque ele estava meio solto.
          - Obrigado senhor...
          - Zack. – Completou ele com um sorriso no rosto enquanto o patrão observava tudo sem um esboço de felicidade.

          Eles saíram de perto e então Calbot levantou-se ansioso e olhando para Zack. Olhou para os lados o casal comia seu arroz a lá grega enquanto o caminhoneiro voltava suas atenções ao hambúrguer e retirou-se do estabelecimento. Precisava arrisca pra ver se ainda era um imã para acidentes numa convergência da lei de Murphy.
          Zack colocou a mão em seu ombro. Orson Calbot vira-se para ele e então lhe pergunta.

          - O que diz suas traquinaras?
          - Conseguimos, mas por via das dúvidas não faça nada arriscado até o fim do dia. As flutuações diminuíram e fixamos a ancora do destino...
          - Sem seus termos de outro mundo, só quero ir pra casa e ver o outro dia amanhecer. Bom fora um prazer inusitado conhecer-lhe.
          - A reciproca é verdadeira. – Concordou Zack.
          - Caso tudo de certo creio que nunca mais nos veremos, certo?

          Zack assentiu com o rosto e então lhe estendeu a mão a apertando.

          - Que tipo de gente é vocês?
          - O tipo que só se vê quando as coisas dão errado. – Respondeu dando-lhe uns tapinhas nas costas e retirando-se.

          Jordan Kimberley olhou o monitoramento e observou que apesar do vazamento de informação aquela dimensão divergente, curvada deliberadamente após aquele acidente seguiram sem maiores transtornos confirmando que nos dias seguintes os relatos de Orson Calbot seriam publicados num tabloide e amplamente tratados como absurdo o caso do ‘Alienígena do Tempo’ como ficou conhecido aquele homem por seu amigo taxado de instável psicologicamente.
          Assim Jordan chegou de volta a base após romper o vórtice artificial sob fortes aplausos mediante seu improviso e recebendo uma indicação a condecoração e uma promoção pois era um agente temporal recém formado. Após sorrisos e tapinhas nas costas o homem fora dormir sob a promessa de que embarcaria e mais uma missão similar no dia seguinte. Exultante com seu desempenho os testes laboratoriais foram realizados e verificou-se que não havia nenhum problema de saúde, e assim Jordan fora dormir.
          Ao acordar a sensação comum ao cruzar linhas temporais divergentes era de um embaralho de memórias comuns onde mesmo se confundia com sonhos. Jordan, confuso perguntou-se sobre o caso anterior se era um sonho quando adentrou no setor de embarque quando viu aqueles homens de jaleco. Um deles se aproximou com uma bolinha nas mãos a deixando cair e rolando uma involuntária sensação de De javu lhe sobreveio o deixando confuso. Jordan a parou com a mão como se previsse aquilo e a colocou no bolso. Olhou para a pulseira e verificou que o fluxo de dados era normal. Pensou em dizer algo quando fora interrompido.

          - Sim, são 6:37, hora estimada do começo do experimento 6.20 espiral. – Disse um dos homens de jaleco observando o antigo relógio analógico que lá havia e assim continuou. – Que se abra o portal. Quero cada fluxo de dados e movimento realizado registrado no banco de dados, nem uma mosca deve escapar de ser mencionada. Lembre-se no caos mesmo uma molécula faz diferença.

          Teria sido aquilo um eco temporal ou era um ciclo dentro de outro ciclo maior? Fosse o que fosse somente em ocasiões especiais alguém de dentro do ciclo poderia despertar a consciência para perceber se tratar de um paradoxo temporal cíclico, aquele homem era Jordan Kimberley. Mais uma volta do ponteiro, pensou Jordan.